A saúde mental nos adultos jovens
Preocupações e soluções

Apesar de menosprezada comparativamente às outras áreas da saúde, a saúde mental é o fator mais influenciador do bem-estar humano. A sociedade atual apresenta grandes divergências comparativamente ao estado pré-pandemia. Em conjugação com o coronavírus como um dos gatilhos para o enfraquecimento do estado psicológico dos adultos jovens de 2024, também as incertezas do futuro e o abuso nas redes sociais se tornaram grandes malefícios para a saúde mental.
Mas quais são as outras preocupações dos profissionais da saúde mental e dos futuros psicólogos quanto à faixa etária dos 18 aos 24 anos? E como é que se podem combater as consequências das doenças mentais em 2024?
Adultos jovens em Portugal: quais os motivos para o enfraquecimento da saúde mental?

Faixas sociais com mais sofrimento psicológico:
- Mulheres;
- Jovens dos 18 aos 29 anos;
- Desempregados e pessoas com baixo rendimento.
Os primeiros anos do início da vida adulta podem ser duros quando falamos de pressão psicológica: corresponder às expectativas de si próprios, a busca pela independência, destacar-se para garantir uma possibilidade no mercado de trabalho... são estas algumas das maiores preocupações dos adultos jovens em Portugal, que se unem e desgastam a saúde mental desta faixa etária, resultando no aumento alarmante dos níveis de ansiedade e depressão.
Diversos são os fatores que atuam como gatilhos para esta sede de “ser alguém”, que acabam por gerar expectativas irreais das noções de sucesso e de felicidade. Fala-se, portanto, do abuso das redes sociais e das incertezas do futuro a juntarem-se aos impactos da pandemia da COVID-19, na qual o isolamento e a falta de interação social foram uma realidade vigente.
O abuso das redes sociais
O constante bombardeamento de notificações e de imagens sobre histórias de vida aparentemente perfeitas gera uma comparação inevitável entre seres humanos, o que estimula sentimentos de não pertença, inveja e baixa autoestima.
Jéssica Duarte, professora da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra (FPCEUC), expressa a sua preocupação nas redes sociais no sentido da utilização das mesmas como um “ranking social”, onde a quantidade de “likes” e de seguidores traduz o valor pessoal de cada um.
“Raramente se mostra fotografias quando se está triste ou quando se está nos piores momentos. Ou então até posso estar muito mal emocionalmente, mas eu vou mostrar ao mundo que estou bem e que me estou a divertir, mesmo que esteja em casa a pôr vídeos ou fotos de há quatro semanas... e isto acontece muito. Há esta pressão, de mostrar que estou bem, que está tudo a correr bem, que tenho uma vida incrível (mesmo não tendo). Estamos a vender, digamos, uma imagem que não corresponde à verdade”

"Nós estamos perante uma geração Z, ou seja, os nativos digitais. Mais tecnologias e menos pessoas, é assim que eles se identificam. Há um acesso muito fácil a tudo que a Internet e a questão das redes sociais é vista como: em vez de se combinar um café fala-se por WhatsApp; em vez de sair à rua para brincar, joga-se um jogo online. Por isso, há menos contato ao nível de relacionamento interpessoal e ao nível das competências sociais, que ficam expostas e são trabalhadas e expressadas de forma diferente"
O FOMO – fear of missing out –, proveniente da dependência emocional provocada pelos media sociais também é uma preocupação dos experientes da saúde mental, uma vez que isto gera “mais isolamento social, maior interferência na saúde mental, menos tempo para as atividades que realmente se gosta e menos contato com os outros”, tornando-se uma “bola de neve”.
A profissional também abordou uma outra vertente prejudicial das redes sociais, sendo esta o bullying e o cyberbullying, confessando que os media abrem um maior espaço para a crítica em si, seja de modo anónimo ou não.
Estas tendências mostram-se, atualmente, na faixa etária dos adultos jovens, mas também nos jovens até aos 18 anos. Beatriz Carvalho, estudante do primeiro ano da licenciatura de psicologia na Universidade Católica Portuguesa, expôs o seu ponto de vista relativamente a esta mesma temática.
“As crianças estão a desenvolver-se para os sítios errados. Esta preocupação excessiva com a imagem, fazer Tiktok’s, gravar tudo, as fofoquinhas... É uma mistura de muitos fatores porque tens uma geração que tem muito acesso, muito social, mas que têm as redes sociais para conviverem uns com os outros e não sabem desenvolver relações significativas”

“Às vezes vamos para a Internet para evitar pensar sobre determinadas coisas, ou evitar sentir determinada coisa ou porque estamos tão zangados, tão aborrecidos, que vamos para a Internet e estamos só ali, sem estarmos sequer atentos ao que se está a passar. E isto é preocupante. Porque estamos a regular as nossas emoções através da Internet. E começam a aparecer muitos casos (e a prevalência disto já é alta) de dependência, não só da Internet, mas das redes sociais. Começa a ser muito alarmante. Consequentemente, desenvolve-se a depressão, perturbações da ansiedade e isto também vai implicar que, de facto, exista mais isolamento por parte dos jovens”
- Jéssica Duarte, professora da FPCEUC -

Incertezas quanto ao futuro
A imprevisibilidade em relação ao mercado de trabalho, a crescente sede de independência inalcançável por causa das dificuldades socioeconómicas e o receio de não conseguir fazer juz ao esforço posto no investimento pessoal são algumas das incertezas que assombram os adultos jovens em Portugal em pleno século XXI. Estes pensamentos relacionam-se, também, com o consumo excessivo das redes sociais, que expõem padrões irreais de sucesso e felicidade e estimulam uma busca para alcançar um estilo de vida idílico.
Joana Pais, psicóloga clínica da APDI (Associação Portuguesa da Doença Inflamatória do Intestino, Colite Ulcerosa e Doença de Crohn), aponta como maior fator de stress o cenário de insegurança que os jovens portugueses vivem.
"Há um panorama de insegurança relativamente a tudo, desde saídas profissionais, mercado de trabalho e mesmo relativamente ao futuro. Ou seja, a compra de casa, a autonomia... vemos jovens adultos a adiar os planos a nível de se autonomizarem (ou seja, de criarem aqui o seu próprio lar para poderem constituir em família ou não). Há aqui um adiar constante dada a insegurança que se vê a nível profissional e mesmo ao nível das condições económicas, que são um bocadinho mais dificultadas”
"Atualmente existem mais exigências na universidade, o que é um fator de stress (...) Também existem mais dificuldades académicas e falta de suporte social"
Quando questionada relativamente à importância dos jovens de se tornarem autónomos, Joana respondeu que este é um fator extremamente importante para a transição para a "adultês" e que aquilo que se vê, na sociedade atual, são adultos jovens com mais de 23 anos, que já deveriam ter possibilidades para comprar uma casa, a trabalharem e a morar com os pais. “Isto terá repercussões ao nível individual”, concluiu.
Entrevista exclusiva a Gonçalo Leite, na íntegra.
Enquanto estudante de segundo ano de psicologia da FPCEUC, Gonçalo Leite suporta o ponto de vista da psicóloga e explica que, na sua opinião, são estas incertezas que mais interferem com a saúde mental.
“Maior parte das pessoas com quem me relaciono ou que oiço relatos, mostram que estão um bocado confusas ao nível do futuro. E, mesmo quando estão decididas, ainda é incerto, por causa do desemprego dos jovens e tudo mais… então acho que diria que o que mais afeta a saúde mental dos jovens é mesmo o futuro e as expectativas que os outros têm em relação a eles”
O estudante confessa que a sua maior preocupação, enquanto ser humano e futuro profissional da saúde mental, é o facto de não ver a situação a melhorar no sentido em que, pelo menos em Portugal, há menos oportunidades para os jovens (em particular ao nível do trabalho) e há cada vez mais emigração.
Será que sobrevivemos à COVID-19?
Publicado em 2021, o estudo “Saúde mental em tempos de pandemia”, de autoria do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, concluiu que a pandemia da COVID-19 é um dos fatores mais impactantes da saúde mental, não só por causa da infeção em si, mas também dos fatores sociais e económicos que dela resultaram. Segundo este mesmo estudo, 34% da população portuguesa apresentava sinais de sofrimentos psicológico, sendo os adultos jovens uma das faixas etárias mais prejudicadas.
A questão do isolamento social é uma das maiores preocupações dos profissionais da saúde mental, algo que contribuiu para outros malefícios. Joana evidencia que, apesar de existirem jovens que não saíram prejudicados da pandemia, a maioria colhe, agora, as consequências dos gatilhos provocados pelo isolamento, desde a “prevalência de sintomatologia mais ansiosa, nem mais depressiva, uma autoestima e uma identidade mais fragilizada, um individualismo maior.
“Nós também temos que pensar que os jovens pós-covid estiveram imbuídos em contextos familiares que nem sempre eram funcionais. O estarem naquele contexto fez com que, de alguma forma, também ficassem mais suscetíveis a outras problemáticas. Existem contextos familiares funcionais que vieram dar maior coesão e até foram um apoio, mas vieram outros contextos que destabilizaram muitos jovens e isso agora está-se a acolher na fase da adultês”
A profissional expõe, também, que o abuso das redes sociais também intensificou os sentimentos na angústia por parte dos jovens que não tinham ferramentas psicológicas para filtrar aquilo que a Internet mostrava, apesar de destacar, no entanto, uma outra vantagem da utilização das mesmas durante a quarentena: “Toda esta exposição às redes sociais veio, por um lado, informar, dar visibilidade e veio dar voz a muitos jovens que não tinham voz”, explica.
Jéssica Duarte também suporta o ponto de vista de Joana Pais e enfatiza, ainda, a sua visão enquanto professora na cidade de Coimbra.
“Noto isto [questão do isolamento] até nos alunos: se puderem não vir para Coimbra a semana toda ficam todos contentes. Mas, na minha altura, quanto mais tempo estivéssemos em Coimbra, melhor era”
A professora destaca a sua preocupação relativamente ao isolamento físico e social, não só por causa da dificuldade dos jovens pós-pandemia em criarem novas relações, como também em manterem as que tinham e suporta a sua inquietação no facto de, desde a pré-história, o ser humano, para sobreviver, precisar de estar em grupo e, sem esta interação, ficava indefeso às ameaças externas (que, apesar de não serem as mesmas da atualidade, eram fragilidades do ambiente envolvente face ao Homem).



"As taxas de sofrimento dos jovens estão, efetivamente, num patamar moderado a grave, o que é preocupante visto que, antigamente, se via mais um ligeiro a moderado. Neste momento, temos pessoas a recorrer mais a apoio psicológico. Por isso, para nós é mais fácil avaliar, intervir e ter a noção deste panorama. Se calhar, antes da COVID, já tínhamos uma procura, uma consciencialização da importância de tratar este domínio da saúde, que é o domínio mental, mas, se calhar, depois da COVID, e tendo em conta também a exposição social, há aqui uma maior preocupação e também uma maior necessidade em recorrer ao apoio psicológico"
- Joana Pais, psicóloga da APDI -

As vozes dos adultos jovens em Portugal
"O que consideras que mais afeta a saúde mental nos adultos jovens portugueses?"

Helena Silva
21 anos, estudante de Fisiologia Clínica na ESS do Instituto Politécnico, Porto
"Considero que a saúde mental dos jovens adultos em Portugal é significativamente influenciada por diversos fatores, sendo que se destacam a pressão académica e social, associadas ao receio do desemprego e da instabilidade financeira. Sinto que, cada vez mais, existe uma pressão de "não ficar para trás", proveniente da constante comparação com os outros, o que gera uma ansiedade constante, intensificada pela competitividade e pelas expectativas, por vezes inalcançáveis, impostas, tanto pelo ambiente académico, como também pelas redes sociais. Esta dinâmica propicia um sentimento incessante de inadequação e de autocrítica, o que pode levar a problemas de autoestima e burnout. Paralelamente, o medo do desemprego e a instabilidade financeira, fortemente relacionados com o atual problema habitacional, são questões bastante pertinentes que afetam drasticamente esta faixa etária. A dificuldade em encontrar emprego estável e bem remunerado, aliada ao elevado custo de vida dificultam a independência e a formação de uma base segura para o futuro. Assim, estes fatores, interligados, resultam num misto de incerteza e insegurança, afetando substancialmente a saúde mental dos jovens adultos em Portugal."

Lara Ximenes
23 anos, estudante de mestrado de Jornalismo e Comunicação na FLUC e bolseira de investigação em Comunicação de Ciência, em Coimbra
"As preocupações com a formação e a vida profissional que naturalmente se refletem em ansiedades de ordem financeira estão bastante presentes. Estamos preocupados com não virmos a ter uma remuneração condizente das funções que desempenhamos, do nível de formação mas acima de tudo do custo de vida real. Estamos a braços com uma crise da habitação e não vislumbro melhorias. Não me pergunto tanto onde quero viver quanto me questiono onde poderei eu viver. Temos uma longa jornada de trabalho – acima da média europeia – responsável por desequilíbrios entre as esferas pessoal e laboral. Perante o que sabemos não é surpreendente que os últimos dados nos mostrem que mais de 30% dos jovens entre os 18 e 29 anos apresente sintomatologia de burnout. Creio que entre diplomados no meu campo de estudo é comum questionarmo-nos sobre se conseguiremos trabalhar na área. Ou se conseguiremos continuar a fazer vida na comunicação e perspetivar uma carreira nela."

Luís Almeida
20 anos, estudante de Economia na UPT, Porto
"Na minha opinião, o que afeta a saúde mental dos jovens adultos em Portugal são as preocupações e as incertezas sobre o futuro, tanto profissional como pessoal.
Durante o nosso percurso académico estamos constantemente em pressão para tirarmos as melhores notas possíveis e sermos bem sucedidos sempre a pensar no futuro. Acho que este é o fator chave que afeta a saúde mental dos jovens adultos em Portugal."

Gabriel Ferreira
19 anos, piloto estudante na Nortávia - Escola de Aviação, Maia
"Na sociedade de hoje, os jovens adultos têm muito em que se preocupar. Desde os estudos, a vida social, a família, contactos para o futuro, procura de futuras vagas de emprego, casa para morar depois de acabar os estudos, entre outros. Mas, a meu ver, o que mais influencia a saúde mental desta faixa etária é, sem dúvida, a incerteza do futuro e a falta de estabilidade financeira na qual nos encontramos. Procurar um emprego que nos consiga sustentar está cada vez mais difícil e isso preocupa os jovens que querem estabilizar e criar uma família ou até mesmo apenas morar sozinhos, visto que cada vez vemos jovens a sair apenas de casa dos pais depois dos 30 anos."
Como preservar a saúde mental

Preservar a saúde mental é essencial para o bem-estar emocional, mas também para a própria saúde física, uma vez que uma mente saudável é mais capaz de gerir o stress e de tomar melhores decisões. O bem-estar psicológico é importante, também, para a maior produtividade e melhor desempenho nas tarefas diárias, pelo que se torna essencial seguir as dicas dos profissionais para melhor cuidar desta área da saúde.
Horácio Firmino, diretor do Centro de Responsabilidade Integrado de Psiquiatria de Coimbra, deixa como conselho aos adultos jovens portugueses o investimento num bom capital mental (que tem haver com as estratégias de resiliência e em termos da reserva cognitiva, desenvolvida com uma boa aprendizagem), sendo esta a chave para o combate da doença mental.
“Quando se sente que há alguma dificuldade, deve ocorrer a um profissional de saúde mental, que fará uma avaliação para identificar fatores de risco de desenvolvimento e começar a trabalhar esses fatores, criando estratégias novas: estratégias de melhor adaptação, mecanismos de interação com o meio rodeia que sejam mais positivos e que sejam de solução de situação. Isto vai melhorar a autoestima dos jovens e vai melhorar, também, em termos das aptidões sociais"
Ao nível académico, o profissional realça a importância de estabelecer exigências, tanto por parte dos pais como pela instituição de ensino, mas também é fundamental “dar ferramentas à pessoa para se poder desenvolver e corresponder às expectativas", respeitando sempre o facto de cada ser humano ser único e com limites diferentes.

Gonçalo Leite acrescenta, ao ponto de vista do doutor Horácio, o conselho que tende a adotar na sua própria vida.
“Os jovens deviam mesmo preocupar-se em fazer o que gostam porque é verdade (e eu percebo) que estamos a viver numa realidade muito incerta, principalmente a nível de saída, mas a realidade atual não é a realidade daqui a dois anos, não é realidade daqui a quatro anos e as coisas mudam muito rapidamente para o positivo ou negativo. Eu acho que o que é importante é que os jovens adultos, dentro da sua área, dentro da sua vida em geral, façam coisas que gostam e que se preocupem menos com a opinião social, muitas vezes divulgada nas redes sociais ou então em círculos familiares”

Joana Pais enfatiza a importância da consciencialização do problema e a consequente procura de ajuda, seja de apoio psicológico, seja de apoio médico e, apesar de esta consciencialização ter aumentado, ainda é uma temática "tabu" que tem que ser combatida.
A psicóloga também defende o consumo de menos ecrãs e do maior convívio interpessoal, dando tempo livre para que os jovens possam mergulhar dentro deles próprios.
"Eu sou muito apologista também de mindfullness. Haver aqui um tempo individual, um tempo para o exercício físico, um tempo para se conectarem com eles próprios e com a natureza. Saberem desligar-se das redes sociais, dos telemóveis, do trabalho, do estudo. Saberem fazer atividade, saberem terem aqui momentos de lazer, momentos de qualidade em que relaxam, em que conseguem fazer atividades prazerosas. Isto vai prevenir que entrem numa rotina que seja desiquilibrante, vai aumentar a probabilidade de terem momentos mais prazerosos, momentos mais relaxantes e vai diminuir fatores como a ansiedade e o stress"
O apelo a mais amor e empatia como método de combater a frieza da sociedade atual é outra recomendação que a profissional deixa aos adultos jovens.

Beatriz Carvalho transforma as palavras de Joana nas suas e deixa uma mensagem de disseminação de amor próprio.
“Amem-se, por favor. Comecem a amar-se e parem de pôr etiquetas e de tentar encaixarem-se em caixinhas, porque nunca vão conseguir fazer isso. Não pensem que são uma confusão porque é no caos que se encontra a ordem, e está tudo bem. Sigam os vossos corações e comecem a amar-se mais. A solução não está no fundo da garrafa, a solução não está em mais uma noite na discoteca nem naquele relacionamento tóxico. A solução está em encontrares algo que te faça feliz, que te faça sentir bem. E, acima de tudo, olhares para o espelho e gostares do que vês, porque isso é o mais importante e, infelizmente, há muita gente que não consegue olhar para o espelho e dizer ‘Eu amo-te’”

A noção de “olhar pelo bem-estar do outro” é um dos lemas que mais sentido faz para Jéssica Duarte, sendo esta uma boa ferramenta para cuidar da saúde mental de quem está ao nosso lado.
“Quantas vezes é que nós passamos por alguém e até podemos desconfiar que aquela pessoa não está muito bem, mas não dizemos nada por vários ‘porquês’. Se calhar era importante tentarmos saber junto da pessoa se está tudo bem, se podemos ajudar com alguma coisa... falta isso na comunidade estudantil. Acho que é muito importante incutir isto nos jovens”
A própria mostrou como uma outra ferramenta para melhorar a saúde psicológica as competências de regulação emocional, seja nos bons dias como nos maus. Refere-se, por exemplo, ao maior carinho e cuidado connosco próprios, assumindo uma atitude mais compassiva quando são cometidos erros que infligissem dor psicológica. “Temos que mudar um bocadinho este discurso interno que nós adotamos e sermos mais bondosos. E temos que viver mais no presente, sem olhar tanto para o passado nem para o futuro”, defende.
A professora da FPCEUC realça, também, a importância do reconhecimento do problema e do “como” e “quando” procurar ajuda, mas não deixa de destacar o “onde” algo que, muitas vezes, os jovens não sabem. “Aqui, na Universidade de Coimbra, [os jovens] têm um apoio psicológico que vem dos SASUC, com uma equipa de psicólogos que prestam apoio aos estudantes”, concluiu Jéssica.

Adultos jovens e os SASUC
É na faixa etária dos adultos jovens que são detetadas a maioria das doenças mentais graves, sendo uma destas vertentes a doença psiquiátrica. Foi em 1966 que a Universidade de Coimbra (UC) desenvolveu os Serviços de Ação Social (SASUC), uma plataforma criada com o objeto de melhor apoiar os jovens do ensino superior perante as dificuldades que lhes podem ser apresentadas. Uma das vertentes mais importantes centra-se no apoio à saúde, incluindo a equipa de médicos, enfermeiros, psicólogos e psiquiatras à disposição. Foi em conversa com Sofia Morais, a psiquiatra responsável por esta área nos SASUC, que a própria evidenciou a importância desta plataforma na vida académica em Coimbra.
“Enquanto falamos dos SASUC, a nossa consulta é uma consulta diferenciada para o jovem universitário e é deslocalizada do polo académico. Primeiro, para permitir maior acessibilidade dos jovens adultos à nossa consulta, para reduzir o estigma do facto de estar dentro do campus universitário e dispomos de uma equipa multidisciplinar (os médicos são do serviço de psiquiatria, mas os psicólogos são da Universidade de Coimbra e também temos outros profissionais)”
As vozes dos adultos jovens em Portugal
"Qual consideras ser a melhor estratégia para preservar a saúde mental?"

Beatriz Santos
19 anos, estudante de Gestão na UCP, Porto
"Em primeiro lugar hábitos de vida saudáveis, uma alimentação equilibrada, sono adequado e praticar exercício físico regularmente.
Depois, é bastante importante fazer algo em que nos sentimos completamente relaxados e que nos recarregue as energias, e isso é algo que depende de pessoa para pessoa. Mas a meditação é um bom exemplo de relaxamento e atenção plena.
Considero também que um bom relacionamento com a família e amigos pode ajudar bastante, na medida em que estamos sempre apoiados e rodeados de pessoas que nos querem ver bem.
Por último, mas não menos importante, um equilíbrio entre a vida profissional e pessoal. Onde o indivíduo deve autoconhecer os seus limites e perceber qual o seu ponto de esgotamento, e quando tem de criar momentos de descontração para evitar isto.
Portanto, para mim, a melhor estratégia para preservar a saúde mental está assente em 4 pilares: estilo de vida saudável; ter uma atividade, ou mais, que proporcione relaxamento e conexão com nós próprios; rodearmos de pessoas que gostamos e são uma inspiração para nós; autoconhecimento e equilíbrio entre a vida profissional e pessoal."

Bárbara Pinto
20 anos, estudante de Ciências da Comunicação na FLUP, Porto
"No meu ponto de vista, os jovens adultos têm uma grande propensão para problemas de saúde mental devido a várias questões, mas uma grande percentagem, acredito eu, por nos formarmos num país onde se acaba o ensino superior sem quaisquer perspetivas de futuro, a nível de empregabilidade em variadíssimas áreas, que leva à dificuldade em atingir objetivos pessoais, como a saída de casa dos pais, a compra de uma casa própria, casar ou criar uma família. Para preservar a saúde mental dos jovens adultos os governos (junto das entidades empregadoras) deveriam ter como principal foco a criação de condições que permitisse o surgimento de novos e mais postos de emprego ou medidas para se desenvolverem ainda mais empreendedores.
É facto que o ponto de partida para a realização de objetivos pessoais é existir um emprego com salários e condições condignas, onde o jovem adulto possa ter uma rotina onde trabalhe e seja recompensado, por isso tenha de igual forma e no seu horizonte a possibilidade de construir e ir alcançando o que almeja: o primeiro carro, viajar e conhecer novas culturas, formações, ter filhos, acesso a serviços de saúde e educação para a família, entre outros."

Santiago Nunes
22 anos, estudante de Turismo, Território e Patrimónios na FLUC, Coimbra
"A melhor estratégia para a preservação da saúde mental dos jovens adultos, com todas as situações atuais que passamos no país, passa pela disponibilidade de aconselhamento psicológico acessível e devidamente preparado. Todos devem experimentar fazer aconselhamento psicológico pelo menos uma vez na vida, o problema é os altos preços das sessões e a dificuldade de encontrar profissionais pelo SNS.
Caso o problema seja resolver essa questão, aconselho os jovens adultos a levarem a sua vida com tempo, não devem olhar para a vida dos outros. Por vezes vemos pessoas da nossa idade ou mais novos a ter mais conquistas que nós, o que causa problemas de autoestima e, por vezes, sociais. O maior conselho que dou é que tudo vem ao seu tempo e é necessário agarrar as oportunidades que achamos importantes para a nossa vida."

Francisco Santos
20 anos, estudante de Engenharia Biomédica no ISEP, Porto
"Na minha experiência, a saúde mental tem uma enorme relação com os passatempos que levamos e a maneira como estes regem a nossa vida.
Eu sempre fui muito adepto da prática de desporto, pratico desde novo e sempre foi uma coisa que não consigo abdicar, independentemente do quão difícil ou atarefada a minha vida esteja. A meu ver, se conseguirmos ter um hobbie no qual nos consigamos abstrair das situações menos positivas, seja desde correr até fazer crochet, temos a nosso dispor uma das ferramentas mais úteis no que toca a ter uma saúde mental positiva.
Considero que uma rotina consistente, saudável e confortável é um pilar de uma boa saúde mental, sendo que, um hobbie que complemente esta é a base deste pilar."