ARE YOU BRAZILIAN?
OH, I LOVE BRAZILIAN WOMEN!

Machismo e xenofobia, assédio e discriminação.
O estereótipo da mulher brasileira no exterior e a luta para combater esse tipo de preconceito.

Ilustração: Melina Gallo

Ilustração: Melina Gallo

“Antes, as brasileiras da FEUP eram um presente para os olhos; agora, são uma cambada de feministas que querem pênis português e não admitem”.
Autor desconhecido

Essa não foi a primeira declaração com teor xenófobo e machista no país lusitano e infelizmente está longe de ser a última desse tipo, mas aconteceu recentemente, no ano passado, em uma rede social com um perfil intitulado “Confissões Feup”, direcionado a estudantes da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto. 

O estereótipo da “mulher brasileira” no exterior já não é de hoje e vem sendo construído a um bom tempo. Seja pelos colonizadores que relataram a aparência das índias seminuas, seja por governos que incentivaram o turismo sexual. O fato é que as brasileiras se cansaram e estão procurando cada vez mais ter voz para denunciar abusos e discriminações, machismo e xenofobia que sofrem ao redor do mundo.

Obra da artista plástica Santarosa Barreto, na exposição "Histórias feministas: artistas depois de 2000", no Museu de Arte de São Paulo. Fotografia: Santarosa Barreto.

"SEE YOU THERE"

No passado até o próprio governo brasileiro explorou a mulher como atrativo turístico. Segundo um estudo realizado no ano de 2008, pela pesquisadora da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), Kelly Kajihara, a mulher brasileira era usada em propagandas do Instituto Brasileiro de Turismo (Embratur), com o intuito de divulgar o país mundo afora e com isso atrair mais turistas. O estudo reuniu publicações desde quando o órgão foi iniciado, no ano de 1966 e constatou que propagandas assim eram feitas principalmente nas décadas de 70 e 80 até o início da década de 90.

Guias da Embratur de 1977 e 1978. Fotografia: Reprodução/Kelly Akemi Kajihara

Guias da Embratur de 1977 e 1978. Fotografia: Reprodução/Kelly Akemi Kajihara

Hoje o foco da Embratur é outro. O instituto já orienta a evitar imagens com apelo sexual para divulgar o país, focando mais nos aspectos culturais e naturais para atrair pessoas de outros países.

Campanha publicitária da Embratur nos dias atuais. Fotografia: Reprodução

Campanha publicitária da Embratur nos dias atuais. Fotografia: Reprodução

A RED LIGHT DISTRICT DE PORTUGAL

Em abril de 2003, uma carta entregue ao governador civil, às polícias e à Câmara de Bragança pedia socorro a situação que se instaurava na cidade do norte de Portugal. As autodenominadas “Mães de Bragança”, realizaram um abaixo assinado pedindo ajuda para retirar mulheres brasileiras que segundo elas eram ligadas a prostituição e “roubavam” seus maridos ameaçando o sustento da família.

Como resultado da ação da polícia, foram fechadas 4 casas de alterne, 6 pessoas acabaram por serem presas e muitas brasileiras foram repatriadas. O curioso é que após a ação da polícia os comerciantes da cidade começaram a se queixaram que os seus negócios haviam caído cerca de 50%.

O caso gerou repercussão nacional, chegou a ser capa da revista britânica Time, que comparava Bragança com a Red Light District, famoso bairro de Amsterdã. Em 2020, inspirou a série Luz Vermelha da RTP e o caso quando relembrado segue sendo um desserviço que contribui para o estereótipo da associação entre as mulheres brasileiras e a prostituição.


ALGUNS COMBATEM

O ano era 2014 e o Brasil iria sediar a Copa do Mundo de Futebol. Pessoas do mundo inteiro iriam ao país em busca de turismo e entretenimento. O comércio em tempos de copa tende a ser superaquecido com a venda de produtos dos mais diversos tipos para os países que vão disputar o torneio. Com isso, uma marca Adidas resolveu lançar uma coleção limitada nos Estados Unidos com camisetas exclusivas feitas para a Copa de 2014, entretanto, algumas dessas peças chamaram atenção por possuírem conotação sexual.

Fotografia: Reprodução

Fotografia: Reprodução

O episódio gerou reação da Embratur que solicitou a retirada dos produtos à venda e a própria Presidente da República na época, Dilma Roussef, se posicionou em sua conta no twitter.     


OUTROS INFLUENCIAM

Fotografia: Evaristo Sá / AFP

Fotografia: Evaristo Sá / AFP

“Quem quiser vir aqui fazer sexo com uma mulher, fique à vontade”.
Jair Bolsonaro

Essa frase foi proferida em 2019 em um café da manhã com jornalistas, pelo atual presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, indo na contramão do combate ao turismo sexual. A declaração se deu no contexto em que Bolsonaro era questionado sobre sua imagem conservadora em relação à comunidade LGBT e que segundo ele o Brasil “não pode ficar conhecido como paraíso do mundo gay”.

No fim do ano passado, o Ministério Público Federal apresentou uma ação civil pública contra o governo pelas declarações discriminatórias do presidente e ministros em relação às mulheres.

E NA MÍDIA PORTUGUESA…

O estereótipo da mulher brasileira que “rouba” maridos e que foi alavancado com o episódio das Mães de Bragança, ainda segue vivo. No programa de humor Patrões Fora, da SIC, a atriz Luana Piovani interpretou uma brasileira com roupas menos recatadas, que era amante do personagem Ernesto, interpretado pelo ator português Luís Aleluia e que estava com ele por interesse financeiro. A esquete foi criticada nas redes sociais por retratar a brasileira como destruidora de lares e o português como vítima.

Imagens: SIC

Imagens: SIC

Já no reality show da TVI, o Big Brother – Duplo Impacto, uma declaração da participante Sónia causou uma repercussão bastante negativa. Ao se referir sobre as mulheres brasileiras, Sónia disse que “elas são de uma raça. Elas são da favela”. A competidora foi punida pelo comentário.

Imagens: TVI

Imagens: TVI

Obra da artista plástica Santarosa Barreto, na exposição "Histórias feministas: artistas depois de 2000", no Museu de Arte de São Paulo. Fotografia: Santarosa Barreto.

SE CALAR? JAMAIS!

Os comentários de teor xenófobo da participante Sónia no programa Big Brother foram a gota da água para um pequeno grupo de mulheres brasileiras criarem um projeto que vem crescendo a cada dia e mostrando os relatos das dificuldades de ser imigrante brasileira em outros territórios.

Em um ato de resistência contra o machismo e a xenofobia que muitas tiveram que enfrentar, esse grupo criou a iniciativa "Brasileiras Não Se Calam". O projeto busca auxiliar e apoiar brasileiras vítimas de assédios e discriminação no exterior.  

Nas redes sociais os perfis têm como objetivo dar voz as mulheres brasileiras, publicando os relatos de maneira anônima. O perfil no Instagram já conta com mais de 35 mil seguidores e mais de 850 publicações, que em sua grande maioria são os próprios depoimentos que também são divulgados em inglês.

O site do grupo disponibiliza números que chamam a atenção principalmente para Portugal. Em um balanço feito de junho a dezembro de 2020, foram contabilizados 461 relatos em 34 países e o número não para de crescer em 2021. Portugal é disparado o país com o maior número casos, com quase 300. Os Estados Unidos aparece na segunda posição com 24 depoimentos.

Mais do que dar voz, o Brasileiras Não Se Calam também apoia as imigrantes através de apoio psicológico e jurídico, promovem cursos e divulgam trabalhos e disponibilizam grupo de apoio. Todo esse trabalho é feito de maneira voluntaria, através de outras brasileiras quem também são imigrantes no exterior. Além de contar com 35 colaboradoras, a iniciativa também possui parcerias com outros grupos de países como Alemanha, Canada e Estados Unidos.

Fotografia: Reprodução

Fotografia: Reprodução

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