Manuel Machado

40 anos recheados de sucesso ligado ao desporto

Manuel Machado, conceituado treinador do futebol português, representou vários emblemas, alguns deles com longa tradição no futebol nacional, como o Vitória SC, o SC Braga, o CD Nacional, entre outros

Desde sempre ligado ao desporto, com formação superior em Educação Física, a sua aventura pelo mundo da competição desportiva começou nos pavilhões de Guimarães, terra de onde é natural. Começou a atuar como técnico auxiliar no andebol e, só anos mais tarde, chegaria ao desporto em que fez carreira profissional, o futebol. Passou pelo banco como responsável tático de oito clubes em Portugal e, ainda, um na Grécia, ao longo de cerca de 20 anos no contexto do futebol profissional.

Passagem nos desportos de pavilhão

Desde muito cedo ingressou no mundo do desporto, inicialmente num ambiente diferente daquele que no futuro faria carreira. Manuel Machado conta que a sua formação desportiva enquanto atleta foi feita em “modalidades de pavilhão no voleibol e no andebol durante quase 20 anos”. Refere, ainda, que acabou por entrar no andebol um pouco por força e insistência “de alguns amigos que já estavam dentro da modalidade” e, enquanto frequentava a sua formação superior em Educação física, que no futuro lhe daria uma carreira de 30 anos enquanto professor no ensino secundário, começou a auxiliar o treinador de um clube de andebol, sediado na sua terra natal, o Clube Desportivo Francisco Holanda. No entanto, atualmente o clube encontra-se extinto, sendo o antecessor do atual Clube Desportivo Xico Andebol, nas camadas jovens do clube, e “as coisas foram se desenrolando”. 

A sua continuidade nos bancos dos pavilhões foi feita a “solo” ainda nos escalões de formação, contando que lhe foi dada “a oportunidade de treinar primeiro no Porto um clube”. Mais à frente conta que foi convidado a “regressar às origens ao Francisco Holanda, desta vez para a equipa sénior”. Manuel Machado, regressaria assim ao primeiro clube onde teve funções fora da quadra, mas, desta vez, assumiria o papel de treinador principal. O professor acredita que “as coisas correram muito bem”, lembrando que o clube estava na segunda divisão na altura, acabou por ganhar o campeonato e com isto conquistou a subida à primeira divisão nacional de Andebol.

Ínicio no Futebol

Anos mais tarde, o professor Manuel Machado, como é mais conhecido, chegaria ao futebol e conta que foi por um “mero acaso”, admitindo que “nunca tinha feito futebol federado, apenas tinha jogado futebol na rua com amigos”. A verdade é que chega ao futebol e ao clube da sua terra com maior relevância no desporto rei, o Vitória SC. Numa altura em que o presidente dos vitorianos era António Pimenta Machado, que tinha acabado de ser eleito por volta de 1980, explica que o seu nome lhe foi referenciado quando este procurava reestruturar o setor da formação do futebol e “estavam a procura de alguém com formação académica, que estivesse na área e que pudesse entrar ali”. O nome Manuel Machado acabou sendo sugerido ao dirigente dos vimaranenses, conta o treinador, sendo que depois foi feita “uma entrevista e assim entrei no futebol”.

Manuel Machado confessa que não tendo grande conhecimento da modalidade teve a sorte de usufruir do contato com dois treinadores muito experientes, falando de Emídio Magalhães e José Pereira, atual presidente do sindicato de treinadores, que o ajudaram na “aprendizagem de certos princípios técnicos e específicos do futebol”. Pois embora considere que o futebol tenha “muito em comum com o andebol, tem também as suas diferenças muito específicas e  que era necessário aprender”. Além disso, refere que aproveitou e de maneira a aumentar o seu conhecimento foi fazendo alguns cursos onde garante que acabou “por adquirir ferramentas para fazer a carreira que acabei por fazer à posteriori". 

Teve um total de 19 anos ligado à formação do Vitória SC, começando com aqueles primeiros cinco anos que exerceu o papel de preparador físico nas equipas do futebol formação do clube. Em 1985 esteve enquanto assistente na equipa técnica da equipa principal liderada pelo treinador Raymond Goethals. Essa que foi a sua primeira experiência no mundo do futebol profissional considera que os cursos e toda a experiência que acumulou nos cinco anos que passou nos escalões de formação do clube que tinha para trás foi “muito importante”. 

No ano seguinte volta aos escalões de formação do clube vitoriano, mas desta vez assume o papel de coordenador da formação, cargo que desempenhou até 2000. Ainda em 1986, assumiu o comando técnico da equipa de juniores até o ano que levou os jovens do clube vitoriano a ganhar o Campeonato Nacional da 1º divisão na época 90/91, pela primeira vez na história do clube. 

O treinador, garante que estes anos nos escalões de formação, seja enquanto treinador dos sub 19 e enquanto coordenador, foi “muito importante e acabou por ser a base e o alicerce“ pois considera que todo o processo de liderança e de monitorização dos mais variados departamentos da modalidade foram uma preparação “para tudo o que vinha aí a partir do ano 2000 no futebol profissional”. 

Primeiras experiências a solo

Manuel Machado, enquanto ainda exercia o cargo de coordenador da formação do Vitória, deixou o comando da equipa de juniores e, estando vinculado ao clube, associa-se a um projeto que explicou ser “um protocolo de um ano do Vitória de Guimarães com o Vila Real FC, na época 91/92, levando para lá 12/13 jogadores provenientes da equipa que tinha sido campeã de juniores, no ano anterior [com o treinador]”. Posteriormente, em 1997/1998, repete a experiência, na Associação Desportiva de Fafe, num projeto do mesmo âmbito e nos mesmos moldes, mas desta vez durante 3 épocas. Conquistou a subida de divisão da terceira divisão, para a na altura chamada “segunda divisão B”.

Após estes três anos, desvinculou-se do Vitória e foi para um clube também da cidade de Guimarães, mais propriamente em Moreira de Cónegos, o Moreirense.

O sucesso foi instantâneo para Manuel Machado em Moreira de Cónegos, e dos quatro anos passados no comando técnico dos Cónegos, este considera que as coisas “correram bem, foram 2 títulos nacionais”, fazendo ainda referência às duas épocas em que conseguiram manter o clube na primeira divisão, algo que tinha sido atingido pela primeira vez na história do clube.

“Pela primeira vez completamente autónomo ganhámos o campeonato da divisão em que competimos, e acabámos por subir à segunda liga, que também ganhámos e pela primeira vez o Moreirense aparece na primeira liga após várias décadas de existência” 
 Manuel Machado

O treinador refere ainda que, na última época, o clube só não foi “às competições europeias porque não foi entendimento da direção fazê-lo por importar custos que não eram benéficos para o clube”, o que seria mais um marco histórico.

Dustin Johnson

Os sucessos pelo Minho e Madeira

Voltou, na época seguinte, ao clube onde deu início à sua aventura no futebol, e finalmente assume o cargo de treinador principal do Vitória SC, na época 2004/2005 e “correu muito bem”. Alcançou assim a sua primeira qualificação europeia, numa época muito difícil. Devido a “confusões diretivas” entendeu que seria melhor sair do clube minhoto. 

Após anunciar que não iria continuar em terras minhotas, surgem duas propostas, que considera ter sido “em boa altura”, provenientes da ilha da Madeira, Marítimo e Nacional. A verdade é que com “o Nacional foi muito mais ágil e estabelecemos logo um compromisso contratual para a época 2005/2006”. Aquela que seria a primeira passagem de quatro do técnico pela Madeira foi concluída com sucesso, tendo conseguido alcançar mais um apuramento europeu, algo que anteriormente o clube só tinha atingido por uma vez, levando assim o clube à sua segunda qualificação para as competições continentais. Embora Manuel Machado considere que a época tenha corrido muito bem, reflete que, do ponto de vista social, não foi tão fácil, [pois pela primeira vez havia saído da sua zona de conforto, a zona do Minho, e por isso foi algo que lhe criou alguma dificuldade] e acabou por voltar ao continente.

Nos anos seguintes representaria o Organismo Autónomo de futebol da Associação Académica de Coimbra, onde garantiu o objetivo “que passava pela manutenção”, e o Sporting Clube de Braga, que considerou ter sido “muito complicado, pois houve que gerir alguns egos que estavam ali muito cimentados dentro do clube” e que não facilitaram tarefa do treinador, mas, mesmo assim, garante o apuramento europeu. Sobre esta época em Braga, refere que, mesmo todos sabendo da relação e da ligação que tinha com o rival, o Vitória SC, nunca teve nada apontar ao Sporting de Braga e sempre se sentiu bem-vindo ao clube, considerando até que “nunca houve nenhum momento que fosse negativo por essa ligação”, acrescentando que nem das bancadas houve “qualquer tipo de atrito”.

Regresso à ilha e a Guimarães

No regresso ao clube insular, refere mesmo que “se a primeira passagem correu bem, a segunda [passagem pelo Nacional] foi também muito bem conseguida”, apontando que a primeira época “acabou por ser muito rica para o clube” e para o próprio, pois o clube conseguiu alcançar o 4º lugar no campeonato e a respetiva qualificação europeia. Para o sucesso dessa época considera que foi “por força da conjugação de vários nomes muito interessantes”, como “Bracali, Marçal, Maicon, Nené”.

Um dos jogadores, que se vestiu de alvinegro nessa época, foi Felipe Lopes e, cheio de elogios, define o treinador vimaranense como “um estrategista que sabe preparar muito bem as equipas para os jogos, possui uma grande capacidade de ler os jogos e fazer as mudanças necessárias no decorrer do jogo”, mostrando que as várias valências de Manuel Machado foram importantes naquela época, pois considera que ele “é um treinador que promove estabilidade ao grupo de trabalho, o que é muito importante nos momentos de maior instabilidade”.

A época seguinte, vivida na Choupana, começou com um grande obstáculo chamado Zenit-Saint Petersburg, que foi o clube que calhou nas sortes alvinegras para uma possível e histórica passagem à fase de grupos. A verdade é que os alvinegros bateram os gigantes russos por 4-3, na Madeira e o empate na Rússia foi suficiente, com um golo já perto do fim de Rúben Micael, e mais uma vez história foi feita pela mão do professor Manuel Machado.

Quando a meio da época, “a equipa ainda competia e encontrava-se bem em todas as competições” foi obrigado a se ausentar durante 5 meses devido a um grave problema de saúde. Quando regressa, com alguma tristeza lamenta que “alguns dos objetivos já tinham sido perdidos”, deixando mesmo assim uma palavra de agradecimento a José Augusto e a Jokanovic “que fizeram o melhor que sabiam e podiam”, considerando que mesmo com todos os problemas o clube fez “uma época com dignidade” e refletindo que “no cômputo geral destes dois anos foi muito positiva” esta sua passagem pelo clube.

Regressa ao Vitória SC e consegue alcançar um apuramento europeu na primeira época, e chega a assumir a equipa para uma segunda temporada pelo clube de Guimarães. No entanto, acaba por sair numa fase precoce da época após a derrota frente ao FC Porto, na supertaça Cândido de Oliveira e a eliminação perante o Atlético de Madrid, nos playoffs da Liga Europa. Após estes jogos considerou que “não havia condições para continuar” e pouco tempo depois ingressa naquela que é até hoje a única experiência fora de Portugal do treinador. 

Aventura curta em Salónica

Ingressou no Aris de Salónica, no decorrer dessa época 2011/2012 e mostra mesmo que “as coisas correram muito bem”, mas em vez de dar continuidade ao projeto na Grécia, preferiu regressar à Madeira e ao Nacional, para fazer aquela que seria a passagem mais longa do treinador pela ilha em que teve durante 4 épocas ao leme do clube insular. 

Na primeira época (2012/2013) garantiu mais uma qualificação europeia pelo Nacional, o que considera algo “relativamente positivo”, pois acabou por fazer “três qualificações internacionais em seis épocas no clube”. Nas duas seguintes acaba por fazer épocas tranquilas, em que garante a manutenção do clube na primeira divisão portuguesa.

Má fase por "erros pessoais"

Mas o fim do ciclo de Manuel Machado nesta sua passagem pela ilha fica marcado pelo começo de uma espécie de calvário após várias decisões tomadas pelo próprio e que assume mesmo como “erros pessoais” que afetaram a sua imagem desportiva. 

Em 2016/2017, ainda no Nacional, conta que “as coisas correram menos bem e o clube estava no limite da zona de despromoção em 16º lugar”. Em janeiro acaba por sair, por um conjunto de fatores, que não só a vertente desportiva. Pouco tempo depois assinou com o Arouca, acabando por sair cerca de um mês depois, após uma sequência de 5 jogos “muito complexos”, em que acabou derrotado. 

Esta época acaba estando ligado a dois dos três clubes que desceram de divisão, mas o treinador considera que não teve “nada a ver com a descida do Arouca e do Nacional”, pois lembra que não terminou a época em nenhum dos clubes e que quando os deixou, estavam ambos em posições de manutenção. 

Após uma época que não correu de feição ao treinador, aceita, 13 anos depois, o regresso a Moreira de Cónegos, após convite do presidente Vítor Magalhães, mas conta que foi muito complicado desde o início, pois encontrou “um plantel só com três jogadores”, tendo após um trabalho exaustivo conseguido contratar 22 jogadores, apontando para a dificuldade da tarefa, pois tratava-se de um “clube que não tinha grandes meios financeiros”. O treinador acaba mais uma vez por não fazer a época toda, explicando que houve “um desentendimento num ciclo menos positivo de resultados” e revela que não houve grandes problemas para ninguém na saída.

O Regresso aos Bancos

Manuel Machado só voltaria aos bancos vários anos depois, ingressando no Berço SC, clube de Guimarães que milita na 4º divisão portuguesa, projeto que durou apenas meia época, pois em fevereiro de 2021, quando o Nacional, que estava com muitas dificuldades na primeira liga, lhe fez o convite para regressar, este foi aceite, com o objetivo de “tentar, em 10 jornadas, fazer um milagre”, considerando que “o coração falou mais alto”, até pela dificuldade que o trabalho iria ter e desse modo teve que abandonar o projeto do Berço SC. O Milagre acabou por não se realizar e explica que é um sentimento muito amargo estar “confrontado com uma situação de descida, fazendo o último jogo em casa já despromovido”, lembrando que em 40 anos de carreira, viu se confrontado com uma situação destas pela primeira vez.

O treinador natural de Guimarães reflete que acabou por não voltar a ter projetos na primeira liga, devido a “este conjunto de más decisões e de maus resultados” e que assume como erros pessoais, e que considera que acabaram por, criar uma imagem negativa da sua pessoa, fazendo “esbater todo um o percurso de 30 e tal anos de algum sucesso, pois neste mundo do alto rendimento e da competição podes fazer muitas coisas bem se fizeres duas ou três mal, comprometes tudo aquilo que fizeste bem para trás”.

No entanto, com uma carreira marcada por altos e baixos, Manuel Machado garante que não pretende outras áreas dentro futebol, que não aquela que foi a sua função em tantos clubes de grande relevância durante tantos anos e, por isso, sem que ainda tenha dado por concluída a sua carreira, reflete que ganhou “o que havia para ganhar”, contando no seu  palmarés pessoal com um campeonato nacional de Juniores, um campeonato de 3º liga, um da 2º divisão B, e ainda um da segunda divisão, juntando ainda os seis apuramentos para provas internacionais, pelo CD Nacional, SC Braga e pelo clube que lhe deu a oportunidade de ingressar neste desporto o Vitória SC.