Reportagem sobre ex combatente da Guerra Colonial
A história de António Júlio Fernandes

No ano de 1961 eclodiu a Guerra Colonial. Um conflito que arrancou vários jovens de suas terras,lares, braços de suas mães, braços de seus amores. Alguns deles, os únicos sustentos de suas famílias. ..
Empurrados para um desconhecido, que muitos nem sequer tinham ouvido falar, onde a morte era apenas uma consequência natural da vida. Uma Guerra que se estima ter vitimado entre 6 a 20 mil Portugueses.
Nesta Reportagem trago a história de Júlio Fernandes, que com 21 anos sai de uma pequena aldeia de Trás os Montes, rumo a um desconhecido (Angola) da qual nunca tinha ouvido falar, como o próprio nos relata.
Deixando para trás a família e a terra que tanto amava. Durante 24 meses,combateu numa guerra apesar de ser contra este conflito.

É com 21 anos que Júlio recebe a notícia, que tem de abandonar a sua querida aldeia Açoreira, para partir para Luanda, onde se viria a juntar ao regimento dos "Barbas Rijas".
Angola terra da qual não tinha noção alguma onde ficava, referindo ainda que até a data de sua partida nunca tinha saído de Trás os Montes.
Medo e ansiedade como nos descreveu, foram os primeiros sentimentos que lhe passaram pela cabeça. Sentimentos esses que o levaram a ponderar fugir do país rumo a França, a pedido de seu pai que por lá se encontrava emigrado.
Apesar de a ideia lhe ter passado várias vezes pela cabeça, o receio de não puder a voltar a Portugal, motivou o abandono dessa possível fuga para França.

Imagem retirada de: Cheveuxcrepusfrun Blog
Imagem retirada de: Cheveuxcrepusfrun Blog

Ultima foto antes da Partida para Angola
Ultima foto antes da Partida para Angola
Chegando a Angola, Júlio fica instalado durante 8 dias num grafanil, num primeiro contacto que o surpreendeu com a beleza das terras angolanas.
Uma primeira impressão positiva, um autêntico "mar de rosas", comparado com o que lhe esperava em Cabungo, para onde partiu passado 8 dias.
Em Cabungo conta dois episódios distintos, que considerou como os mais marcantes. Um deles foi uma noite em que dormiu numa garagem de uma fábrica de farinha.
Contou ainda uma história onde ele e os seus colegas apertados pela fome, fintaram a morte a uma armadilha (mina) que estava colocada perto de uma bananeira. Confessou que ainda hoje não entende como a mina não explodiu.

Imagem retirada de : ResearchGate
Imagem retirada de : ResearchGate

Primeira foto em Angola (Luanda)
Primeira foto em Angola (Luanda)
É num quartel em Cabungo, que Júlio descobre que Serafim dos Anjos Rego (seu conterrâneo) se viria a juntar a ele. Algo que não aconteceu, pois Serafim acabou por falecer em combate, vitima da explosão de uma mina.
Serafim dos Anjos Rego, que seria futuro cunhado de Júlio, pois após os acontecimentos de Angola casa com Irene Rego, também de Açoreira.
Uma perda que o deixou abalado pois para além de ser um conhecido e amigo seu, era a única pessoa que conhecia da sua terra natal.

Quando questionado sobre o que mais lhe custou naqueles longos 24 meses, Júlio afirmou que foi tudo. Nas suas palavras, "um dia era como se fosse um ano". Vivendo um medo constante, pois sabia que a 200\300 metros do quartel a sua vida estava em risco.
Regressado a Portugal sofreu vários episódios de stress prós traumático, tendo uma vez quase incendiado a casa de seus pais durante a noite sem ter dado conta, num episódio de sonambulismo.
Ainda hoje Júlio confessa que evita ao máximo qualquer tipo de medicamentos, referindo que constantemente tomava fármacos sem ter noção das razões ou o que efetivamente estava a ser administrado.

A história de António Júlio Fernandes é um de muitos relatos. Foi uma passagem que muitos dos seus companheiros que estão na foto ao lado também viveram. Não é por isso que deixa de ser única e ter menos valor.
Ainda hoje todos os anos, os membros do regimento dos "Barbas Rijas" se encontram anualmente num almoço simbólico com a companhia toda.

Para terminar queria agradecer ao senhor António Júlio Fernandes não só por me ter concedido esta entrevista e reportagem, mas por todos os ensinamentos e apoios que me prestou.
Como ele refere, muitas histórias ficaram por contar, muitas delas que de forma egoísta guardarei para mim. Cada momento desta reportagem foi extremamente gratificante e enriquecedor.
A qualidade desta experiência muito se deveu ao senhor Júlio e também á sua esposa Irene que sempre mostrou a simpatia e a hospitalidade reconhecida das gentes de Trás os Montes, onde de conversa em conversa oferecia uma cerveja ou algo para petiscar . Mais uma vez o meu obrigado aos dois.
Pode ouvir a entrevista completa no link abaixo ⬇
Entrevista Completa usada na Reportagem;
